Cheguei quando o treinador já começava a explicação. Atraí muito mais olhares dos que treinavam espada e escudo - o que eu estava acostumada a frequentar - e não me importei com isso. Tentei ouvir o que o instrutor falava:
- Hoje vamos treinar disparo de flechas enquanto estamos em movimento. Disparar enquanto o nosso alvo está em movimento é fácil, quero ver vocês atirarem quando são vocês é que se movem – ele foi até um canto da Arena e puxou uma caixa de ferro por uma alça. – Aqui estão alguns utensílios que vocês irão utilizar – ele enfiou a mão e puxou um tênis. – Esses calçados são encantados e após calçá-los, eles começarão a mover-se em qualquer direção. Haverá alvos parados na Arena, cada um tem direito ao disparo de cinco flechas. Você deve acertar o maior número de alvos possíveis. Não serão julgados somente os alvos destruídos, mas sim técnica, precisão ou pelo menos se você conseguiu atirar a flecha direito – ele apontou os dois campistas mais a frente.
- Vocês serão os primeiros, peguem seus arcos e calcem os tênis. Vão.
Os campistas apontados calçaram os tênis e começaram a andar sem controle. Seguraram o arco sem jeito tentando equilibrar-se nos próprios pés. A velocidade do movimento começou a aumentar. Logo, alvos surgiram do chão da Arena. Os dois tentaram disparar algumas flechas enquanto andavam desordenadamente, mas sem muito sucesso. Um dos rapazes conseguiu acertar um alvo, mas posso jurar que foi sorte. Após cinco flechas, os calçados se acalmaram e os semideuses puderam tirá-los. O treinador pegou os tênis e jogou-os na caixa de ferro, foi até os campistas e disse-lhes:
- Agora vocês cinco, coloquem os tênis.
Os cinco da minha frente saíram para o treino. Uma menina acertou três alvos, atraindo alguns aplausos de amigos. Os outros não tiveram participação relevante. Eu estava no próximo grupo. Era minha vez. Fui até a caixa e peguei um par dos tênis que se descontrolavam já em minha mão. Tirei os meus e calcei-os nos pés. Logo que fiquei de pé, comecei a andar. Senti meus pés pulsando e obedecendo ao ritmo imposto pelos calçados. Não consegui parar de andar e comecei a sentir a velocidade aumentando. Puxei meu arco das costas e peguei uma flecha da aljava. Não parecia tão difícil. Estiquei-a na corda e assim que um alvo entrou em minha mira, disparei. Um instante antes, meus pés viraram-se bruscamente para o lado, minha flecha foi por um caminho totalmente distinto do qual planejei. Droga. Continuei andando sem rumo. Peguei novamente uma flecha, estiquei-a na corda e esperei um alvo entrar em foco, um novo baque nos meus pés fizeram-me desviar a flecha. Malditos tênis! Parece que sabe quando vou disparar. É... Talvez ele saiba. Tirei mais uma flecha da aljava. Preparei-a com perfeição. Fingi atirar, meus pés sambaram. Estava feito, era isso. Recuperei o equilíbrio, mirei e atirei. No alvo. Olhei para baixo sorrindo como quem diz “ganhei de você”. Continuei andando em uma velocidade maior pela Arena, uma flecha, estiquei a corda. Mesmo processo. No alvo. Ahá! Vi que os outros já tinham disparado as cinco flechas e essa era minha última. Preparei-a no arco. Esperei um alvo entrar em foco, fingi atirar, nada. Tentei novamente, nada. Ora, vou atirar. Quando fí-lo, meus pés se moveram. A flecha disparou-se para longe. Ele já estava um passo a frente novamente. Sorri novamente para baixo, desta vez com uma expressão de “dessa vez você me venceu”. Meus pés descansaram, tirei os sapatos e esperei o resto do treino. O treinador encerrou a prática com uma explicação sobre os encantamentos nos tênis que eu não consegui prestar muito atenção. Botei o arco e a aljava de volta na caixa, enquanto o treinador elogiava aqueles que acertaram pelo menos um dos alvos e dispensou a turma.